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Fotografia: Elena Kalis |
Hibernava pela razão e circunstâncias.
... há um amor que pulsa pela sede de amar até as entranhas. Tempo de despertar.
... há um amor que pulsa pela sede de amar até as entranhas. Tempo de despertar.
Amor de lavada é aquilo que provoca rupturas definitivas com um velho amor. Diante de um amor de lavada, o que um dia de fato foi, deixa de ser -embora tudo que tenha sido. Amor de lavada pode vir de um novo amor - por outra pessoa, por si. Melhor quando este precede àquele. Desconfio.
"Sou feliz só por preguiça. A infelicidade dá uma trabalheira pior que a doença: é preciso entrar e sair dela."
Mia Couto
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A República |
Idos de Novembro. 15 de Novembro de 2013. Marco na história do STF.
Não por acaso esta data, o que só reforça meu lamento pela 'forma' deste STF que aí está. Que meu lamento não se confunda minimamente com o dever de penalizar quem pratique/praticou um delito. Meu lamento diz com o circo do poder - quando circo, leia-se, é capaz de causar dano incomparavelmente maior que prejuízo ao erário público, este, além do dano material, leva alguns poucos cidadãos para a cadeia, enquanto aquele pode ferir de morte os pilares da democracia. Sê atento, cidadão, antes de festejar.
"Ninguém ocupa impunemente o poder"
IDOS DE MARÇO
Deves sempre temer as grandezas , oh almaSe não consegues dominar as ambiçõesQue tenhas, cuida então com dúvida e prudência,De as tolerar. E quanto mais adiante fores,Mais cuidadosa, mais inquisitiva sê.Quando, por fim ao ápice chegares,Cesar,Assim logrando estatura de homem celebrado,Acautela-te inda mais ao saíres à rua.Vistoso potentado como seu cortejo;Se por acaso da turba aproximar-seAlgum Artemidoro que traz uma cartaE te diz : "Lê sem mais demora,São coisas capitais que te interessam muito."Não deixes de parar; não deixes de adiarQualquer negócio ou discussão : não deixes de afastarAqueles que se vêm prosternar para saudar-te(tu os veras mais tarde ); o Senado tambémEspera: trata pois de conhecer depressaAs momentosas novas que traz Artemidoro.
Konstantinos Kavafis (1863-1933)
[Comentário: Caio Julio Cesar (100-44 ac. ),militar e político,conquistou a Gália e o apreço da plebe na Republica Romana. Temendo a popularidade e as possíveis ambições do líder, os conservadores patrícios do senado, mataram-no a golpe de punhais no senado.Artemidoro,filosofo grego, conforme Suetonio, tentou alertar Cesar.Como ensinou a Revolução Francesa : “ NINGUÉM ocupa impunemente o poder...”.]Disponível em: http://pensarsocratico.blogspot.com.br/2012/10/kavafis.html
Título: A República
Autor: Manoel Lopes Rodrigues
Data: 1893
Óleo sobre tela
A liberdade é a possibilidade do isolamento. És livre se podes afastar-te dos homens, sem que te obrigue a procurá-los a necessidade de dinheiro, ou a necessidade gregária, ou o amor, ou a glória, ou a curiosidade, que no silêncio e na solidão não podem ter alimento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo. Podes ter todas as grandezas do espírito, todas da alma: és um escravo nobre, ou um servo inteligente: não és livre. E não está contigo a tragédia, porque a tragédia de nasceres assim não é contigo, mas do Destino para si somente. Ai de ti, porém, se a opressão da vida, ela própria, te força a seres escravo. Ai de ti se, tendo nascido liberto, capaz de te bastares e de te separares, a penúria te força a conviveres. Essa, sim, é a tua tragédia, e a que trazes contigo.Nascer liberto é a maior grandeza do homem, o que faz o ermitão humilde superior aos reis, e aos deuses mesmo, que se bastam pela força, mas não pelo desprezo dela.A morte é uma libertação porque morrer é não precisar de outrem. O pobre escravo vê-se livre à força dos seus prazeres, das suas mágoas, da sua vida desejada e contínua. Vê-se livre o rei dos seus domínios, que não queria deixar. As que espalharam amor vêem-se livres dos triunfos que adoram. Os que venceram vêem-se livres das vitórias para que a sua vida se fadou.Por isso a morte enobrece, veste de galas desconhecidas o pobre corpo absurdo. É que ali está um liberto, embora o não quisesse ser. É que ali não está um escravo, embora ele chorando perdesse a servidão. Como um rei cuja maior pompa é o seu nome de rei, e que pode ser risível como homem, mas como rei é superior, assim o morto pode ser disforme, mas é superior, porque a morte o libertou.Fecho, cansado, as portas das minhas janelas, excluo o mundo e um momento tenho a liberdade. Amanhã voltarei a ser escravo; porém agora, só, sem necessidade de ninguém, receoso apenas que alguma voz ou presença venha interromper-me, tenho a minha pequena liberdade, os meus momentos de excelsis.Na cadeira, aonde me recosto, esqueço a vida que me oprime. Não me dói senão ter-me doído.
[Fernando Pessoa]
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Gustav Klimt |
Esconder-se no porão, de vez em quando, é necessidade vital. Precisamos de silêncio e solidão, e, não, apenas os poetas. Senão, corremos o perigo de nos esvairmos em som, fúria e esterilidade. O campo para que a palavra se instale para o autor e para o leitor é o campo do silêncio e da audição.Adélia Prado
Embora todas as razões
da razão
danaram-se elas todas em seu berço
de passado e de futuro
tudo porque eu te devorava
no instante desta espumante
tal e qual o tempo das bolhinhas
do fundo à borda do copo
as felicidades são estanques
e eu com isso, quando pra mim
felicidade mora no atemporal instante
de seus efeitos? [perpétuos]
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Dois anos |
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Tudo parecendo exatamente igual |
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e absolutamente diferente - embora a essência. |
A vida não comunica muito claramente sobre a força do tempo. É que, já confessou, não manda recado. Diz a que veio, desafiando com fenômenos que modificam estados, quietudes, formas, escolhas. Simplesmente apresenta, sem explicação.
...
[Dialogando com a razão, esse mesmo tempo se encarrega das respostas - especialmente mostrar porque para alguns o desafio tem proporções tsunâmicas.]
As redes virtuais são mesmo fantásticas. Positiva e negativamente. Pelo meu gosto pessoal, o que mais apreciei nos últimos anos, através da blogosfera e depois pelas redes sociais, foi conhecer mais detidamente comportamentos, ideologias e fronteiras do trânsito de cada um (mídia e pessoas). Assistindo ao que vejo hoje, me sinto cada vez mais enojada da mídia brasileira. Antes disso, nojo e vergonha alheia pela mediocridade e preguiça de quem, leitor, reproduz qualquer coisa. Pior que isso, na maioria das vezes reproduzem mentiras e estorietas, sem buscar conhecer a realidade dos fatos ou todas as versões. Em tempos de tantas mídias de informação aqui na rede e, antes, em tempos do Dr. Google, é inaceitável o compartilhamento de tanta (des)informação deturpada ou deslavadamente mentirosas. Cada vez impressionada mais o aplauso da classe média (nós usuários disto aqui) para a quantidade de lixo publicado, com cunho meramente político-eleitoreiro. Pasmo diante da torpeza destes, pois só chancelam o continuísmo do modelo político que temos, de que tanto 'reclamam'. E noto, o óbvio e nem por isto menos interessante, que reclamam pela não-cassação de politico condenado, mas não conhecem a 'lei' (CF) que permitiu isto. Leis que são feitas por políticos que eles próprios elegeram. Elegem e não lembram quem. Se lembram, desconfio do porquê da lembrança. Não sabem pra quê serve o Congresso, a Assembleia Legislativa, Câmara de Vereadores e, pior, nunca entraram em nenhuma destas suas casas, espaços do povo. Aliás, não sabem que político é mero representante do povo; tratam como divindade detentora de prerrogativas próprias do império dos céus; abaixam-se, fazem reverência a 'otoridades'. Nesse aspecto, aliás, não há meio termo para o brasileiro tacanho: subserviência ao extremo ou grosseria desmedida no trato, faltando com o respeito digno de qualquer pessoa. Não sabem se fazer respeitar, não sabem indicar soluções, participar, mas são mestres em acusações e julgamentos sem base mínima de fundamento. Cultura do técnico de futebol de mesa de bar. Doutores em passar a responsabilidade aos outros. Nada chamam pra si. A culpa é do governo, é do político, é do juiz, é do servidor público, é do vizinho. Não pensam quem os subsidia de desinformação, muito menos ponderam o porquê aceitam como verdade o que lhes cai no colo como verdade. Incansáveis, replicam na rede sobre a importação de mão-de-obra médica tida como uma aberração estratégica do governo, agarrados em discursos vergonhosos, desqualificando o povo de outras nações; não se dignam saber o que são politicas inclusivas, não conhecem a história do seu próprio país, quanto mais saber a história dos outros países. Não conhecem quem cursa medicina no Brasil, e jamais pensaram sobre o nexo entre a falta de médicos na selva, no sertão e o tipo de cidadão brasileiro que ingressa nas faculdades de medicina - seria otimismo demais esperar isto de um povo que foi doutrinado a não pensar, e pensa que pensa. Não conhecem, em suma, seu próprio papel. Seu protagonismo se resume a marionetes comandadas pelo ventríloquo político-eleitoreiro das mídias usuais. Tão ingênuos - desconhecimento é causa! - que pensam desejar mudanças, quando na verdade se deixam conduzir ao bel prazer do que sempre foi e segue lhes sendo dado pelo império da mídia convencional, sua única fonte de informação. Fosse diferente, não leríamos tantas ideias miseráveis nas redes sociais. Reflexo do que se é/pensa.
Por outro lado, sendo condescendente com quem tem a chance de buscar conhecimento e não o faz, fico pensando, não se pode ser bom em tudo. Afinal, estudar dedicadamente os mercados de tecnologias, automóveis, grifes, viagens de turismo clichê e tudo o mais que a Forbes sinalize como meta de vida, não deixa espaço para saber do resto. Então replicam na rede e em discursos o que as mídias pensaram por si; porque não há tempo nem vontade de pensar, tão ocupados em encontrar os meios de atingir a Meca do poder que essencialmente lhes importa: o mercado de consumo desenfreado e preferencialmente somente para alguns. É que, sem o olhar da cobiça alheia, qual seria a graça? É feito aquela piada, sobreviver a um naufrágio com a gostosa hollywoodiana. Só os dois numa ilha deserta. Transam dias a fio, até que ele se cansa. Indagado por ela do porquê da rejeição, responde: qual a graça comer a mais gostosa das celebridades se não tenho pra quem contar?
A culpa é sempre dos outros, pelos outros e para os outros. Pensar/sentir por si, nada. Isso sim é soda... gasosa, coca-cola, pepsi ou guaraná.
Eu não quero ver você cuspindo ódioEu não quero ver você fumando ópio, pra sarar a dorEu não quero ver você chorar venenoNão quero beber o teu café pequenoEu não quero isso seja lá o que isso forEu não quero aqueleEu não quero aquiloPeixe na boca do crocodiloBraço da Vênus de Milo acenando tchauNão quero medir a altura do tomboNem passar agosto esperando setembro, se bem me lembroO melhor futuro: este hoje escuroO maior desejo da boca é o beijoEu não quero ter o Tejo escorrendo das mãosQuero a Guanabara, quero o Rio NiloQuero tudo ter, estrela, flor, estiloTua língua em meu mamilo água e salNada tenho vez em quando tudoTudo quero mais ou menos quantoVida vida, noves fora, zeroQuero viver, quero ouvir, quero ver(Se é assim quero sim, acho que vim pra te ver)
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Fotografia: Carstem Witte |
Ando sofrendo de um mal que percorre caminhos acima e abaixo da derme, epiderme. Sofrendo de contato. Contato vai além do toque. Fala sobre o que já leram olhos e ouvidos. Vai além pois, no encadear solto, de mais saber do outro, contato comunica um tantíssimo de nós próprios. Diz dos movimentos desconhecidos, (in)capacidades, superação, surpresas. Dos significantes. Contato é uma espécie de estar em si, observando a voluntariosa mecânica que impulsiona o salto pra fora - da razão. É então, antes, um descontrole. Move para o contato com a forma vulgar de contato. Presença. Isso arrepia. Epidermia?
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Picasso - Moon |
Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso melhor se guarda o vôo de um pássaro
Do que um pássaro sem vôos.
Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica,
por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo:
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar.
Antônio Cícero
No que se tiver algum controle, a governabilidade dos afetos pressupõe parceria entre dois dispostos. Dispostos a governar os limites das ilimitadas vontades/possibilidades; sondar o que até então insondável a si e ao outro. Permitir-se, permitindo. Concessões mútuas, em que cláusulas pétreas do estatuto da relação sejam a amizade e o desejo de seguir [seguindo, acompanhando, crescendo, adiantando, atrasando, com pausa, sem pausa, no compasso da pressa de saber(-se), respeitar(-se), mais]. Não governo meu querer, as razões, critérios, governo apenas as horas que estão ao meu alcance. E ainda assim, uma governança de até ali. Muitas surpresas.Daí a graça.
Quando estou longe
Quero ficar perto
Quando estou perto
Quero ficar dentro
Quando estou dentro
Quero ficar mudo
Quando estou mudo
Quero dizer tudo
Gozar é fácil. Qualquer um pode. Basta alguma imaginação e boa vontade. Mas gozo bom, gozo de verdade, é gozo poético, gozo digno. Aquele gozo de quem goza pelo gozo do outro, pela sua forma. Gozo poético é gozo de quem olha no olho e sente, enquanto come corpo, cabeça, olhar. Porque não se esgota em um meio estético, material. Come a alma, devora entranhas, mergulha em todos os meios líquidos, deslizando em cada pedaço. Gozo digno é gozo falado, gozo sentido, gozo gozado. Há muitas formas de dizer do gozo. Há gozo que se expressa, inclusive, em portoalegrês, em crioulo cabo-verdiano. Noutros signos, línguas, linguagens.
Conversei longamente com aquele olhar
disse tanto, foi além
bem mais que as (não)promessas
Morei uma eternidade naquele abraço
que se fosse pra ser nada
bastava-se na força impressa
[Se for pra doer
que doam apenas os músculos
exaustos]
Já nem busco entender
esta força que nos pousa
coloca em, diante de
Me agasalho na irrecorribilidade dos tropeços do acaso
em seus mapas rasgados que ocultaram trechos, jogando
no trânsito movediço que remete/arremete
desde o cá e pra o lá, simplesmente então
aceito
E enquanto bebo da presença
deste presente que se apresenta
me agarro ao único lapso de liberalidade
que a vida confere: escolher
- se vou ou se fico
[sem medos]
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Pablo Picasso, O Sonho |
"E explicava: dormir com alguém é a intimidade maior. Dormir, isto que é íntimo. Um homem dorme nos braços da mulher e sua alma se transfere de vez. Nunca mais encontra suas interioridades."
Mia Couto
É chocante em que posições,
com que escandalosa simplicidade
um intelecto emprenha o outro!
Tais posições nem o Kamasutra conhece (…)
Wislawa Szymborska
Há ciclos que encerramos por liberalidade.
Outros, são encerrados para nós.
Bem-vindo 2013 das
mudanças e das promessas
que se vão cumprindo.
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Salvador Dalí |
Morro do gesto paralisado na carne e na superfície. Quando quero, quero olhos sobre a topografia de todas minhas feiuras, do que sou feita, do que me move. Meu verso. Meu anverso. Meus mistérios - e que estes não sejam todos descobertos.Se ainda assim for vista alguma belezaentão ressuscitopela honestidade da volúpia.
Há homens que não são homens-poetas, mas pura poesia na naturalidade e espontaneidade de ser e agir. Encantadoramente explícitos no seu desejo, sem que desconfiem, é o que faz a atormentada mulher-poeta desejar amá-los.