sexta-feira, 22 de julho de 2011

Aquele que ensandece

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Toda mulher,
se já não conheceu,
deveria um dia conhecer,
um gigante de Marraquesh.
- apesar do Marrocos.


O anão de Marraquesh
       [Affonso Romano de Sant’Anna]

Em Marraquesh há um anão que ensandece as mulheres.
Elas vão ao banho (dizem aos maridos)
fazer limpeza de pele
mas algo a mais ali sucede,
basta ver como depois
além do corpo
a alma lhes vai leve.
O segredo deste anão está guardado na palma de sua mão,
pois com seus dedos sabe sublimar as mulheres.
Elas vêm
e ele
com silencioso gesto
pede que se dispam - se despem.
Se ele dissesse: voem voariam,
se dissesse: dancem, dançariam,
se dissesse: amem-me o seu mínimo corpo, amariam.
Mas pede apenas que larguem suas vestes
e se deitem
à espera que suas pequenas mãos se agigantem
e abram portas, janelas
desvãos abismos
na vertigem da viagem dentro da própria pele.
Quando se despem
despedem-se dos maridos
e já não mais carecem de amantes
é como se Penélope
convertida em Ulisses
nas mãos do anão
a Odisséia sentisse.
Ninguém sabe exatamente o que seus dedos operam.
Começa pelos pés
e algo vem subindo
devagar
ao leve toque que não toca,
que roça, às não fere,
que solicita e impera
e vai em círculos
como se o bem e o mal se transcendessem numa espiral de delícias.
Os maridos e parceiros ficam no hall do hotel bebendo uisque, nas quadras jogando tênis e nunca saberão o que ocorreu ao leve toque daquelas pequenas potentes, suaves mãos.
Finda a massagem (nome conveniente à transfigurante viagem) as mulheres reaparecem translúcidas, caminhando a um centímetro do chão
irrompem inalcançáveis
como se tivessem tido uma visão.
Aos maridos não adianta qualquer explicação. Há na pele da alma delas algo de que jamais se esquecem:
o irrepetível toque
dos dedos
e das mãos
do anão de Marraquesh.



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